A cortina abriu-se lentamente, sendo puxada por uma pessoa pequenina e de cara colorida. O seu rosto estava pintado com um sorriso vermelho e os olhos pintados de preto, ressaltavam ainda mais o seu azulado brilhante. Fez sua reverência, anunciou sua introdução e o espetáculo começou.
A platéia batia palmas calorosa quando dois homens - um gordo espalhafatoso e de fala grossa e um magrinho esperto de fala fina - entraram e começaram o número no palco. O pequeno palco ficava imenso ao redor de tantas risadas. O gordo sentou numa gangorra posta no canto do palco, exigindo que o magrinho fosse até lá tentar jogá-lo para o céu. Quando o magrinho aproximou-se e sentou no banco final da gangorra, nada aconteceu. Todos ficaram esperando que algo realmente surpreendente acontecesse, e então o silêncio reinou. Os dois olharam um para o outro com um certo medo, mas então o gordo logo se levantou e esbravejou algumas palavras que foram, evidentemente, abafadas pelas risadas da platéia ao ver o magro estabacar-se no chão.
O espetáculo, então, prosseguiu de mão cheia. A bailarina e a trapezista entraram na mesma hora, uma de cada lado. As pessoas cada vez mais ficavam fascinadas com o que as duas eram capazes de fazer. Alguns até pensavam que elas tinham o poder de voar, tamanha eram suas habilidades. A bailarina dançava alegremente pelo palco, enquanto a trapezista esbanjava seu poder de pular de um trapézio para o outro. Em um determinado momento, as duas estavam enrroladas no pano de seda, situado no meio do palco, agradecendo aos aplausos.
Então, o número principal chegou. Um palhacinho que parecia estar triste por ser o último da lista de apresentações. Ele entrou tímido e quieto, falando baixinho, pra poucos ouvirem. Uma música bonita rolava solta atrás da sua cena, também baixinha, parecida com ele.
Sua voz foi aumentando e então todos perceberam que ele estava recitando um poema lindo, mágico.
Então, o último palhaço do espetáculo tirou uma flautinha de seu bolso traseiro. E, seguindo o ritmo da música que estava atrás, fazendo seu pano-de-fundo, ele tocou-a. Uma magia encantava seus olhos e expressava uma envolvente felicidade.
Ele sentou-se no proscenio, ainda tocando a flautinha. Mesmo de olhos fechados, ele conseguia sentir que toda a platéia estava integrada numa só, todos sendo levados pela mesma magia que o palhaço estava passando sobre aquela flauta.
O gordo palhaço colocou sua cabeça para fora das cochias, mostrando seu grande e vermelho rosto pintado. A bailarina, do outro lado do palco, deu uma olhadela de leve e entrou na cena, graciosa. A trapezista veio logo atrás, dando camalhotas e dando saltinhos graciosos, acompanhando o som que saía de trás e misturava-se com a flautinha da frente. O magro palhaço empurrou o gordão, que, imitando cair mas também dando camalhotas pelo palco, entrou em cena e misturou-se as outras duas. Os quatro começaram a dançar, fazendo uma roda, rindo e rindo à toa. Pareciam ser de um mundo mágico, aquilo parecia não existir no mundo real. Tudo exalava um tipo de felicidade incrível, uma áurea magnífica.
O palhacinho que estava sentado no proscenio levantou-se lentamente, caminhando com passos articulados, ainda tocando sua flautinha doce. O seu rosto demonstrava serenidade e alegria por detrás da pintura. Tudo girava ao seu redor, apesar de não estar junto dos outros.
A sua flautinha foi parando, a música de trás baixando. Os quatro integrantes da cena não estavam mais em roda, mas sim dispersos no palco, contemplando uns aos outros. Todos exalavam sentimentos individuais, e estes pareciam estar misturados e fundindos num lugar só - o teatro.
A música ficou mais baixa e os cinco artistas foram parando, lentos. O palhaço que estava em frente a todos soltou sua flauta e, por fim, disse:
- Enquanto mundos que tentam ser ideais para as pessoas estão aí, nos sufocando com toda sua fumaça e ausência, há ainda um lugar para se refugiar. O teatro é como uma casa qual todos são muito bem recebidos e não querem sair de lá nunca mais. O amor, a mágica e a felicidade perdidas, ainda podem ser vistas em lugares secretos. Um desses lugares é aqui. Sejam bem-vindos.