sábado, 30 de janeiro de 2010

Cinema Paradiso (1988)

Existem muitos livros que falam de si mesmos. Contam histórias sobre o próprio livro, ou falam sobre outros livros, dando ao leitor a impressão de uma história dentro da outra. Porém, são poucos os filmes que fazem a mesma coisa. E, se fazem, são poucos os que prestam.

A história do cinema é mais antiga do que imaginamos, porém não é difícil saber como era o cinema antigamente. E como ele mudou, tanto em aspectos de localização e construção, como em relação aos filmes. Antigamente, os cinemas ficavam nas ruas - era uma casa própria para se assistir filmes. Hoje, o cinema se esconde entre lojas e departamentos, dentro de shoppings, obrigando você a entrar lá e fazer qualquer coisa além de ir apenas assistir um filme.

Isso não significa uma coisa ruim, em todos os aspectos - afinal de contas, ficou mais fácil, agora você pode além de assistir filme, lanchar, passear e ainda reservar um tempinho para fazer umas compras e/ou pagamentos extras. No entanto, aquela magia de antes, a empolgação de sair de casa apenas com intuito de assistir um filme foi mudando ao longo dos anos e hoje está praticamente extinta. Agora, essa intenção se resume apenas aos cinéfilos - e mesmo assim, são poucos os que se encorajam a enfrentar uma fila quilométrica para ver um filme na estréia. Ou seja, o lugar chamado cinema se perdeu e tornou-se apenas mais um "pedaço" daquela estrutura gigantesca e cheia de outros tantos pedaços de consumismo.

Então, foi com essas essas perguntas que eu fiquei na cabeça após ver o filme Cinema Paradiso (1988), do diretor italiano Giuseppe Tornatore (o mesmo de A lenda do pianista do mar). O filme se passa todo em flashback. Após uma ligação que Salvatore, um cineasta italiano, recebe da sua mãe, ele precisa voltar à cidade natal para o velório de Alfredo, seu instrutor, quase pai, e também quem lhe ensinou a projetar os filmes na tela e a amar o próprio cinema (mesmo contra vontade). Assim, antes de dormir, Salvatore, mais conhecido como Totó, relembra seu crescimento com o cinema, desde os tempos de criança que fugia de casa para ir se encontrar e brincar com Alfredo, até sua adolescência e juventude, quando ele se apaixona perdidamente por Elena. E, quando ela deixa a cidade e o abandona, ele decide se mudar para Roma, tornando-se o grande cineasta do começo e final do filme.

Mas não só isso. O filme também retrata as coisas mais clássicas acontecia no cinema. Por exemplo, em todo cinema sempre tinha alguém que ficava no andar de cima, cuspindo em quem sentava embaixo. A primeira fileira era sempre ocupada pelos pirralhos da cidade. E todo o cinema fervilhava quando aparecia qualquer insinuação de beijo na tela. Também retrata a própria evolução do cinema, o início dos filmes pornôs - que os pirralhos da primeira fileira sempre eram pegos pelo lanterninha se masturbando - até os filmes de trapalhada, como O Gordo E O Magro. E parece que a cidade vai mudando de acordo com os filmes. As crianças crescem, viram adolescentes e não mais vão ao cinema para assistir filme - mas para arranjar namorado. Enfim, entre tantos outros clássicos do cinema num filme só.

Considerado um dos melhores filmes da década, obteve vários prêmios, como Oscar e Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro de 1990. É emocionante, lindo, e você se esquece de como o final é triste com meia hora de filme. Não tem como não se comover. (Para mim, a cena mais triste é quando o Cinema Paradiso é demolido. Ali, é como se dissesse que a era das casas de filmes, essas mesmas que eu falei ali em cima, o cinema "na rua", se perdesse para sempre. Explodisse em milhões de pedaços de cimento e poeira, para nunca mais construirem outro de novo. É triste demais.)

No entanto, assim como nos deixa triste pela morte de Alfredo, nos traz uma nostalgia de como era o cinema naquela época. A 7° arte se perdeu demais - hoje não basta ter só uma boa história pra contar. É preciso toda uma computação gráfica, cores fortes e vibrantes na tela, e tecnologias em 3-D para impressionar a platéia. Não vale mais uma história intrigante ou emocionante, algo que te faça pensar fora daquelas salas climatizadas com poltronas confortáveis. São poucos os filmes que te deixam com uma pulga atrás da orelha - como esse fez comigo - e geralmente levam a poucas discussões. E, mesmo assim, ainda havendo alguns, não recebem o tratamento ou a bilheteria merecidos.

Não quero dizer aqui que isso é de total ruim. É claro que também há seu lado bom - hoje, já que o cinema não é mais um lugar isolado, você assiste filme para se divertir com as crianças, algum encontro amoroso; enfim, tornou-se mais uma fonte de entreterimento. O que nunca deixou de ser, na verdade, mas toda aquela empolgação e magia de uma história de cinema talvez tenha se perdido no ar, levado com a poeira e os escombros do Cinema Paradiso. Hoje cinema virou mais cotidiano - e os filmes também parecem estar no mesmo caminho, rápidos e sem muita empolgação.

(Eu posso estar generalizando, eu sei, mas e é claro que já assisti a alguns filmes maravilhosos no cinema. Mas não me culpem, mesmo que não tenha vivido, eu sinto uma certa "saudade" do ritual que se fazia para ir ao cinema, e do que poderia acontecer lá dentro, sem falar dos próprios filmes antigos - que, cá pra nós, são bem melhores do que os de hoje, não acha?)

É lindo, mas também é um filme que fala sobre a própria história do cinema, e como um grande amor pode surgir por detrás daquela cabina de filmes, e como a vida ainda podia ser doce - mesmo com um final amargo.

De qualquer modo, só me resta agora recomendar à todos que assistam, e não só uma vez. Esse vale a pena ter na estante de casa, como filme "de cabeceira".

Recomendadíssimo!


PS: Se fôssemos fazer um tipo de "Cinema Paradiso" do século XXI, como é que seria o filme?