No começo, não faz muito sentido. Não parece certo. Certo? Não, não é esse o termo. Comum. Igual a tudo que você sempre fez. Não parece certo só porque não é do seu costume que isso aconteça. Mas coisas acontecem - coisas que você não espera. E só depois que a noite passa, depois de ir embora e acordar, no outro dia - só depois de tomar banho, almoçar, voltar para casa e deitar na cama para dormir que você percebe que os resquícios ficaram para você. E eles vão te perturbar pelo resto da semana.
Então, aconteceu. Por tão pouco tempo - e tão solto. Amizade colorida. Nada de paixão ardente, desejo incontrolável - nada de jogar na parede, pressionar um corpo contra o outro, essa pressa pelo sexo. Nada. Também não teve aquele amor ardente, duas almas e corpos se encontrando, em perfeita sintonia, que tanta gente comenta. Nem isso. Foi apenas um beijo. Carinhoso, gostoso, devagar. Com mão no rosto e segurando pela cintura. Suavemente, a cabeça deitada pra um lado. Só. Um beijo de fim de festa, para fechar com chave de... hmm... Bronze? Não, prata, talvez. É. Chave de Prata. E no final, telefone dado. Nem sei pra quê fui inventar de dar meu telefone.
Sabe aquela vontade de que a pessoa ligue no outro dia? Não precisa ser necessariamente no outro dia - mas, sei lá, no fim de semana. Na sexta - Ei, vai fazer alguma coisa esse fim de semana? Tá afim de sair? - qualquer coisa assim. Essa esperança que vai crescendo, tomando forma. E o pensamento, que não deixa, não vai embora.
E quando mistura pensamento com esperança? Você - crente, estúpida - acha que, quanto mais pensar, de algum modo, seu pensamento vai sair da sua cabeça e ir pra roda gigante do mundo e trazer aquela pessoa para você. Nem que fosse, sei lá, por uma tarde na universidade. Mais um fim de semana, com o beijo de fim de festa. Você acredita que se forçar seu pensamento por, sei lá, duas horas por dia, ela vai ligar amanhã às 19h. Ou vai ligar na sexta de noite, saber se você vai sair - Poxa, meu aniversário, vamos comemorar? Você imagina, contida, sem querer se iludir, se comprometer antes do concreto aparecer. E, mesmo assim, tenta evitar, tenta fugir. Mas é inevitável. De repente, você se pega pensando na mão no seu rosto, e você segurando a cintura...
É tão estranho quando coisas assim acontecem - de repente você se põe na mão da outra pessoa, mesmo sem ela estar nem aí para você. Quem sabe se ela está ou não? Esse é o mistério pior de todos. Você procura entender cientificamente - entende que o mistério por trás de qualquer coisa, isso de não saber, ou de querer saber o que está escondido, libera hormônios no seu cérebro, fazendo você se sentir, no mínimo, com desejo sexual. (E você também lê que começa daí o negócio todo que te anda acontecendo por dentro, mas, para você, foi tão simples que nem pareceu um desejo sexual. Mas é, beijo também é sexo). Os dias passam. O fim de semana se cristaliza na sua cabeça. E cada dia que passa, você dá mais uma mão de brilho. Dá mais um beijo, repetindo, continuamente, pequenas cenas na sua cabeça. Mesmo sem saber que a possibilidade daquilo se repetir é 50-50%. Tanto tem, como não tem. E o seu lado pessimista vive dizendo que não...
Mas, mesmo assim, você pensa. E acredita que a força desse pensamento vai, de algum modo, fazer-te cruzar com ela por aí. Pelas ruas do centro, pelos corredores do shopping, pelas janelas perdidas de ônibus lotados. Ou que pelo menos ela vá lembrar do seu rosto quando olhar seu nome na sua lista telefônica... E te ligar, na sexta feira - Então, vai fazer o quê? Tá afim de sair?
Sim, sim. Claro que estou. Só estava esperando você me chamar.